terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O LIVRO VERMELHO DA MACONHA E DO COMUNISMO

[Texto publicado no blogue 16tonelada, autoria de Cesinha [é outro cesinha]. Simplesmente HILÁRIO!]

[Acontece que na sexta-feira passada eu fiquei mais de 8 horas esperando meu vôo no Congonhas. Tudo atrasado. Pista fechada e muita chuva. Muita gente reclamando também. Quando a inspiração voltar, prometo que eu escrevo a respeito. Por ora, para não dizer que o blogue tá abandonado, vou publicar um texto que eu havia postado no finado Na Vala, sobre como a minha experiência no movimento estudantil se iniciou. Eu tive tanto tempo para pensar na vida na sexta-feira que lembrei disso aí embaixo].
Há um certo momento da vida em que os vários conceitos que te acompanham se misturam. Tu é jovem e inexperiente, um amador, ousaria dizer. Tudo é novidade e tu tem a necessidade de fazer tudo muito rápido. Nem sempre pela maneira mais sensata ou fácil, costumeiramente pelo primeiro caminho com que tu te depara. Seja lá o que isso queira dizer. Custe o que custar.
Afinal, apenas com esse instinto impulsivo para vivenciar (e sobreviver) às barcas furadas que surgem na vida de cada um. No meu caso, esse ímpeto juvenil se manifestou, dentre outros episódios, através de uma viagem de quase 80 horas (ida e volta) para Goiânia, num ônibus lotado de adolecentes comunistas gritando palavras de ordem do início ao fim, sem banho e a escassa presença de estudantes do sexo feminino, sendo que a melhorzinha das poucas tinha o suvaco mais cabeludo que o meu.
O ano era o de 1995, lá por novembro. Auge dos meus 16 anos. Eu e o Chuy fazíamos parte do Grêmio Estudantil do colégio. Todo aquele discernimento e maturidade política que alguém nessa idade pode ter. Hormônios à flor da pele e a preocupação de não desperdiçar sequer uma das raras oportunidades de fazer sexo.
Certa tarde um membro da UJS - União da Juventude Socialista aparece em nosso colégio, convocando para a Convenção Nacional da UBES - União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, em Goias. Com todos os trejeitos e verborragia típicos de um jovem socialista, o rapaz argumentou sobre a importância do envio de uma delegação de nosso colégio.
A negociação foi acirrada.
- O Sistema Capitalista está monopolizando os meios de produção do proletariado. O senhores feudais desse país querem impedir o acesso à educação à classe operária. É nosso dever lutar pela aniquilação do Estado de Direito vigente.
- Bah, legal véio. Passa outra hora aqui que conversamos melhor.
- Seguiremos para Goias, lutaremos por um Brasil mais igual, haverá as festas de confraternização, o ônibus vai lotado de mina e vai ter guria do Brasil inteiro. Uma loucura.
- Quando vamos?
Após aprovação da viagem e liberação de verba pelos demais integrantes da agremiação, uma semana depois eu o Chuy nos encontrávamos na sede municipal do PC do B em Porto Alegre, esperando pelo meio de condução e pelos demais integrantes da barca anti-neoliberalismo.
Quase desistimos.
Até então aqueles sujeitos cabeludos, maconheiros e com a camisa do Che Guevara eram completamente estranhos à nossa rotina de colégio particular, onde o comum eram guriazinhas vestindo o moleton do Hard Rock Café comprado nas últimas férias em Orlando.
Acabamos seguindo viagem, mesmo assim.
Os primeiros quilômetros na Freeway já foram o suficiente para mostrar o que nos esperava. Discursos intelectuais decorados acirravam os ânimos de alguns companheiros. O banheiro inaugurado por algum marxista mais radical se encarregava de ocupar os olfatos dos incautos passageiros. E o ônibus que, em circunstâncias normais, não estaria em condições de realizar uma viagem curta, quanto mais uma até o centro do País, garantia a emoção aos amantes da adrenalina.
Nada disso foi problema. Eramos jovens, comunistas e, em favor de uma sociedade mais justa, não poderíamos colaborar com as grandes empresas do transporte. Era nosso dever apoiar o pequeno produtor. O ônibus de segunda mão fazia parte dos planos para um mundo mais justo. Além do mais, parte do valor pago pelo pacote POA-GOIÂNIA deveria financiar a maconha da diretoria gaúcha da UJS que (des)organizava a excursão.
Duarante a ida, pelo menos duas paradas por problemas mecânicos, na qual destaco uma empurrada no ônibus por mais de 1 km até o posto mais próximo. Várias poltronas marcadas pela ressaca de vinho barato após duas noites mal dormidas e muita maconha. O arrependimento era grande, lamentávamos eu e o Chuy.
Mas daí chegamos na capital goiana e, a essa altura do campeonato, já estávamos adaptados à nova realidade e até já havíamos decorado alguns refrões dos hinos Abaixo Capitalismo.Agora éramos comunistas desde sempre. Como não havíamos percebido antes?
- FMI sacana, devolva nossa grana - Gritávamos extasiados.
- Viva, viva, viva a juventude socialista - Sugeria um riponga mais exaltado, fazendo referência à uma letra do Raulzito.
No Congresso, de fato, jovens socialistas de todo Brasil espalhavam-se por diversos alojamentos improvisados no campus da Universidade Federal da cidade. Goiânia conhecia o CAOS.
Durante o dia nos ocupávamos nas diversas oficinas, plenárias e debates discutindo, basicamente, a importância do modelo soviético para o futuro do Brasil. À noite, show de bandas locais e muita interação entre todos garantiam a diversão. A maconha não tinha hora, era dia e noite.
Em dado momento, foi confeccionado com uma página de jornal, a maior CATRONCA que já tive notícias. Tal feito, digno de nota no Guiness Book (se isso não fosse tão capitalista), foi resultado da intera das dezenas de lenistas, marxistas, stalinistas, e demais "istas" envolvidos no processo revolucionário em questão.
O maior cigarro de maconha do sul do mundo foi fumado em Gõiânia naquele dia, arriscaria palpitar. Um beque sem fronteiras. Sem distinção de raça, cor, crença. Fruto da união de todos pelo BEM COMUM. Nesse momento percebemos que um mundo igualitário e justo era um sonho possível. Os maconheiros socialistas se insurgiam contra o sistema opressor. Se a reforma agrária era uma utopia, a divisão herbária já estava em pleno andamento.
O comunismos é realmente comovedor.
Em relação aos demais objetivos da viagem, eu e Chuy até que nos demos bem. Não desperdiçamos a oportunidade de exercitar a retórica marxista com as militantes de plantão. O vigor de nossa parca idade clamava por uma manifestação ideológica mais intíma.
E para garantir o resultado favorável não ecomomizamos esforços. Sabíamos que precisavamos de um DIFERENCIAL para chamar a atenção das comunistas do congreso, já que pelo discurso de esquerda seria complicado, uma vez que ainda éramos iniciantes no tema e não havíamos decorados palavras de ordem suficientes para convencer alguém a DAR pra gente.
Resolvemos pagar para usar o banheiro de um Hotel da região e garantimos o nosso diferencial frente aos demais congressistas TOMANDO BANHO!
A tática funcionou. Entre umas bitocas aqui e ali, APROFUNDEI o discurso revoluvionário com uma menina, chamada de Quiñones pelos companheiros mais próximos. A Quiñones era amiga da Valderrama, pela qual o Chuy voltou apaixonado.
No final das contas, votamos nas plenárias conforme orientação de nossos tutores da UJS, elegemos a nova diretoria e encaramos mais 40 horas de estrada de volta à capital gaúcha, mas agora com sentimento de dever cumprido. Chegamos em Porto Alegre doutrinados e os efeitos dessa viagem pelo submundo pseudo-socialista ficaram impregnados no meu discurso até alguns poucos anos atrás. Pobre dos ouvidos alheios que muito ouviram meus discursos decorados.
Felizmente, passou.
As pessoas que conheci na viagem também passaram a fazer parte de minha vida por um bom tempo. Inclusive foram peças importantes na arquitetura de um boicote às eleições do DCE da PUC em ´97 que culminou na queima das urnas em frente às lentes da RBS TV.
Mas esse acontecimento já é um outro episódio. Qualquer dia eu conto

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