segunda-feira, 6 de maio de 2013

JÁ QUE O GAÚCHO DO DIOGO COSTA NÃO LIBERA O VÍDEO DELE SOBRE A CORÉIA DO NORTE VAI ESSE AQUI

ESSES ROMANOS SÃO UNS LOUCOS!!!!!!

[Ou não? Este é a parte final do segundo capítulo do livro "O Deus da Máquina" de Isabel Paterson, publicado no Reaçonaria.org ]

Quando uma nação passa por condições em que o costume se mostra perecível, a liderança desastrosa e a monarquia opressiva, a razão deve definir a fonte primária de autoridade, para investi-la em uma forma viável.
 
Por essa sequência, provavelmente encurtada, Roma tornou-se um laboratório político. O que entrou no cadinho precisa ser deduzido a partir dos mitos, lendas, tradições e instituições que se formaram nos obscuros séculos da história inicial da cidade. Não parece que Roma tenha sido nunca primitivamente bárbara, se a cidade teve seu princípio no comércio, usando dinheiro2 e tornando as terras propriedade privada; são elementos de uma civilização avançada. E as fábulas são frequentemente inconsistentes, como seria o caso se fossem parcialmente importadas e misturadas. Histórias como a de Rômulo e Remo e do estupro das Sabinas não podem ser aceitas literalmente; nem precisam ser de origem local. O roubo de noivas faz parte de uma cultura bárbara, na qual não há desonra. A crença de que uma loba amamentou Roma deve ser ainda mais antiga e pode ser derivada de um totem selvagem; mas não necessariamente, porque quando a Europa era bárbara, um proscrito era uma “cabeça de lobo”, uma antiquíssima figura de linguagem. A sugestão nas três histórias é de que Roma sempre foi mais ou menos uma cidade aberta, admitindo refugiados, exilados ou imigrantes. Eles trariam costumes variados que deveriam ser harmonizados segundo regras gerais.
De toda forma, a figura do asilo certamente se incorporou ao sistema social e legal romano e, por fim, criou o caráter especial da cidadania romana. Caracteristicamente, era necessário nascer grego, mas era possível se tornar romano.
 
Outra vez, podemos suspeitar de um resquício de antigas dificuldades em encontrar um modo avançado de associação que funcionasse, por causa de uma instituição peculiar a Roma. É uma instituição altamente extraordinária num povo civilizado, porque existia completamente fora da ordem social. Ninguém sabia exatamente qual a sua função, no sentido em que todos sabiam o que significavam as Virgens Vestais. Esse cargo realizou seu objetivo de maneira tão completa que o objetivo foi esquecido. Embora famosos por sua coragem militar, os romanos não praticavam duelos, nem toleravam a vingança privada informal. Porém, existia um homem, que devia ser um criminoso, dedicado a uma ocupação que tinha de ser conquistada e mantida por assassinato. Esse homem era o Sacerdote de Nemi, “beneath Aricia’s trees”.
 
Those trees in whose dim shadow
The ghastly priest doth reign,
The priest who slew the slayer,
And shall himself be slain.3
 
Quem estava incumbido desse posto sanguinário havia obtido essa função matando o ocupante anterior. Ele nunca poderia deixar o abrigo do bosque sagrado e estava permanentemente sujeito a ser atacado por outro fora-da-lei que conseguisse alcançar esse santuário da morte. O Sacerdote do Ramo Sagrado foi explicado com referências eruditas a ritos de sacrifício, o bode expiatório que carrega os pecados do povo ou o deus-rei que morreu e foi ressuscitado, como o sol, para garantir a fertilidade dos campos e da tribo. Esses rituais mágicos podem ter sido incorporados pelo sacerdócio de Nemi. Mas os romanos eram solidamente prosaicos até em suas superstições. Suas divindades eram principalmente úteis, com funções práticas definidas. Bem, em sua origem, havia um uso prático para o sacerdócio de Nemi. Era desestimular atentados contra a liderança. Não se pode imaginar uma medida mais ironicamente efetiva para desencorajar tais ambições que a determinação de um ponto em que os aspirantes devem enfrentar contendores e onde o vencedor deve continuar, para sempre, sujeito ao mesmo desafio. Que ele tenha o que pediu e fique satisfeito – o recurso à força. Obviamente, apenas homens já banidos procurariam o santuário terrível. São esses os termos sob os quais o homem deve existir quando não há lei. Estando já muito avançados, tendo superado os estágios do costume e da liderança, e sendo conscientes da ineficácia da democracia, os romanos foram obrigados a resolver o problema do governo em termos racionais, trabalhando com o que tinham. Tinham a família como a unidade social, compensada pela lei contratual sobre a propriedade, o que fazia do indivíduo a unidade política. Assim, a família não podia se dividir numa forma realmente feudal. Tinham clãs (gentes), de antiga linhagem local, que podiam ser reconhecidos como uma aristocracia, mas não em ordem hierárquica feudal. Tinham uma população grande e variada, os plebeus, palavra que significa apenas multidão, as massas; mas não necessariamente os pobres. O elemento mais importante eram as tribos, ou seja, a divisão da cidade em áreas específicas, que supostamente restaram da união prévia de três comunidades. Essas divisões eram estritamente territoriais e políticas, com fronteiras fixas; as pessoas eram incluídas nelas por local de residência, não por descendência. Essas tribos tinham igual representação por direito a partir da propriedade de terras, moradia; e tinham a obrigação de suprir contribuições iguais para a defesa militar. Representação vinculada à área. Mudanças subsequentes – áreas adicionais, divisões novas ou subdivisões por razões políticas – mantiveram essa forma; havia fronteiras regionais e representação.
Roma nunca foi um “todo” indiferenciado, uma simples agregação de partículas, como postula a teoria da democracia. Desde o início, a cidade de Roma foi uma federação, com a forma federal, que engloba bases permanentes e estrutura, os elementos da arquitetura. Tanto os elementos como a forma precisam de um sistema eletivo; e os romanos primeiro tentaram um mandato vitalício para um executivo eleito. Foi completamente insatisfatório, porque não é possível haver controle confiável ou limitação dos poderes executivos nesse caso.4 Tendo-se livrado de seus presidentes vitalícios (reis), os romanos tomaram rigorosas precauções contra seu retorno por usurpação. Eles não teriam só um executivo chefe; e, mesmo em posições mais baixas, inclinavam-se por ter dualidade de cargos, o que funcionava muito bem no conjunto. Os cargos políticos também eram restritos a mandatos fixos e curtos, com rotatividade de exercício e intervalos em que um candidato não poderia ser reeleito. Essa última disposição é correta, já que a única razão para determinar um tempo de mandato é poder tirar o ocupante. O principal objeto de votações, em qualquer caso, era o voto contra pessoas ou medidas. Os romanos também suspeitavam continuamente de seus generais, proibindo até um comandante vitorioso de reentrar na cidade sem permissão formal. Estavam determinados a impedir a tomada militar da autoridade civil. E foram assombrosamente bem-sucedidos, considerando sua posição, que necessitava de uma boa porção de defesa e constante prontidão militar. Nenhuma outra nação antiga manteve esse controle civil sobre o exército por centenas de anos.
 
Os cargos políticos eram ocupados principalmente pela aristocracia e eram em parte eletivos, em parte sujeitos a nomeação ou preenchidos por cooptação; os diferentes métodos, com mandato vitalício apenas para senadores, impediam a rigidez excessiva ao mesmo tempo em que preservavam a continuidade. Também era possível que homens de talento excepcional subissem a partir dos escalões inferiores. Nada era absolutamente petrificado em status. A igualdade dos senadores (diferente do que ocorre em uma aristocracia hierárquica) e a eleição de outras autoridades não apenas permitia, mas exigia o debate público no corpo de governo e a livre expressão de opiniões pelos cidadãos. Como tanto os eleitores como os ocupantes de cargos públicos possuíam propriedades, tinham um interesse sólido em manter a nação funcionando, com a concomitante obrigação de defesa militar.
 
Mas o golpe inigualado de gênio político foi que o estado romano previa não apenas o adiamento, mas o impasse concreto. O poder dos plebeus, por meio de seus tribunos, era de obstrução manifesta. Os tribunos da plebe não podiam propor nenhuma medida, mas podiam parar os trabalhos; e suas pessoas eram invioláveis. Nada é mais essencial ao bem-estar de uma nação que a restrição ao governo, por meios legítimos. Um mecanismo sem freios, um motor sem dispositivo de corte, foi construído para a autodestruição. O sistema romano era durável porque era organizado de tal maneira que as tensões se transformavam em força e o controle era assegurado pela separação entre a agência executiva e o dispositivo de corte. Essa realização se tornou possível pela definição da fonte de autoridade. “Os romanos possuíam, desde os tempos mais antigos o conceito de jus, que é mais amplo que o de direito positivo declarado por uma autoridade, e denota uma ordem que obriga moralmente os membros da comunidade, tanto humanos quanto divinos.”5
 
Essa ideia de direito como um conceito abstrato não é dada pelo costume, pela liderança, por um conselho ou um rei; tampouco é compatível com a democracia. Em todos esses casos, a autoridade é arbitrária, tendo sido dada ou num costume particular, ou depositada em pessoas por precedência (ancestralidade ou antiguidade) ou determinada pelo número. Os romanos afirmaram que há uma ordem moral no universo.


2 A familiaridade com a função do dinheiro permitiu a Roma governar um império no devido tempo. Diz-se que os espartanos, não sendo acostumados ao dinheiro, eram rapidamente pervertidos quando abandonavam sua modesta economia de subsistência. Não conseguiam manter o mínimo de honestidade em relações contratuais, tendo sido criados no comunismo. No nível mais baixo, não eram capazes nem mesmo de entender os limites da corrupção. (N. da A.)
3 “Além das árvores de Arícia / Aquelas árvores em cuja sombra escura / O sacerdote espectral impera / O sacerdote que assassinou o assassino / E será ele mesmo assassinado.” Do poema The Battle of the Lake Regillus (A Batalha do Lago Regilo), escrito por Lord Thomas Babington Macaulay em 1842. (N. do T.)
4 Uma monarquia constitucional hereditária só é possível como um desenvolvimento a partir do verdadeiro feudalismo. A condição necessária é a sobrevivência de uma aristocracia fundiária com herança inalienável. Quando isso desaparece, a monarquia afunda em seguida. (N. da A.)
5 CAMBRIDGE ANCIENT HISTORY: The Primitive Institutions of Rome. H. Stuart Jackson. Macmillan. (N. da A.)